Prof. Israel F. Araújo (poemeiro@hotmail.com)
Prof. Antonio Marcos Ferreira (arquivo pessoal)
ENTREVISTA: Prof. Antonio Marcos Ferreira
(Filósofo) fala sobre Política, ódio, nazi-fascismo, #EleNão e mídia:
"quem aponta os rumos dos temas a serem explorados é a mídia"
O BLOG POEMEIRO DO MIRI pediu, via
e-mail, Entrevista ao Professor e Filósofo Antonio Marcos
Quaresma Ferreira, que atualmente cursa Mestrado em Estado, Governo e
Sociedade. Trabalhando na docência na Seduc-PA, o professor Antonio Marcos atua
também no Incam (Instituto Caboclo da Amazônia), na Rádio Comunitária Natureza
FM (em Igarapé-Miri, PA: freq. 87,9 mhz) e é o atual Presidente da Academia
Igarapemiriense de Letras (AIL), entre outras frentes de atuação.
Na seguinte Entrevista, ele trata, p. ex.,
de problemáticas de nosso tempo, em especial sobre Eleições, Democracia,
diálogo, "fake news", "EleNão", poder do discurso e atuação
da grande mídia. CONFIRA:
ENTREVISTA: ANTONIO MARCOS FERREIRA
Blog Poemeiro do Miri: Prof. Antonio Marcos, estamos vivendo,
nestes últimos meses (sobretudo nas últimas semanas) um acirramento das
disputas políticas. Nesse cenário, o discurso (pronunciamentos,
posicionamentos/saber o que pensam essas lideranças políticas etc.) deveria
ocupar um lugar central, para que a população se torne cada vez mais
esclarecida, informada, sabendo dos projetos e programas dos Candidatos(as).
Na sua opinião, é isso mesmo que está
acontecendo, ou não? Ou, enfim, como o sr. vê essa realidade? São debates de
propostas ou é de outra coisa que estamos tratando nestas eleições para a
Presidência do Brasil?
Prof. Antonio Marcos: É uma pergunta muito
interessante pois nos faz refletir exatamente sobre o contexto de massificação
e padronização que prevalece nos tempos atuais, ou seja quem aponta os rumos
dos temas a serem explorados é a mídia. A grande intenção é vender um produto,
isto é, a partir de uma lógica de mercado. Nesse sentido a política também
entra no jogo. A emissora de televisão, por exemplo, explora aquilo que pode
ser facilmente “comercializado” e promove o espetáculo de acordo com interesses
de quem as patrocina ou melhor associa-se a suas perspectivas. Não parece nada
“comercial” tratar sobre programas de governo, pode parecer técnico demais. Por
isso a seleção de conteúdos, imagens e a preferência por questões mais
apelativas, isto é, aquilo que “vende” com maior facilidade. Grande parte dos
candidatos também esquecem as propostas e partem para apelações que nesse
contexto ganhariam maior evidência. O que para um processo político é
prejudicial, já que rouba a cena do debate realmente necessário.
Blog Poemeiro do Miri: Tendo em vista que o sr.,
atualmente, faz Mestrado em Estado, Governo e
Sociedade e que tem formação em Filosofia (que é estudioso da Ética,
da participação popular e da política), como o sr. vê essa
relação (ética, política e participação) ou, de outra forma, é
possível falar que o campo da ética é um campo visível nestas eleições? Ou o
problema maior é, justamente, um modus de
apagamento da ética na política?
Prof. Antonio Marcos: Entendo que o debate
da ética pode muito bem ser atrelado a questão da justiça social. Aristóteles
defendia que a política é uma extensão do indivíduo, de modo que um sujeito
sendo um péssimo exemplo do ponto de vista da vida particular não será boa
referência para a vida pública. É muito provável que a vida pública sirva para
desmascarar sujeitos que na vida privada sempre foram cidadãos ruins. No
contexto eleitoral, por exemplo, é possível perceber muito bem essas questões,
onde figuras facilmente identificadas como exemplos negativos do ponto de vista
da ética, apresentam-se como “salvadores” e defensores de uma “nova política”,
ou que vão combater a corrupção, mas se formos olhar seus modos de fazer
campanha, veremos imensa contradição, com práticas irregulares, compra de votos
etc, e tal. É preciso questionar: Que propostas realmente defendem? As
propostas condizem com suas práticas/experiências (seja dentro da associação,
sindicato, igreja, escola)? de onde vem os recursos de suas campanhas? Quem os
patrocina? qual será o custo ao final da sua campanha? Enfim é preciso
questionar, relacionar os discursos e práticas.
Blog Poemeiro do Miri: Professor, muitos estudiosos da
política falam, nestes dias, de uma disseminação do ódio entre as pessoas,
entre as classes. Há uma fala muito sedimentada acerca de um neofascismo, um
neonazismo, que estariam muito bem enraizados e ainda crescendo, no seio da
sociedade brasileira. Fala-se muito na candidatura presidencial de Jair
Bolsonaro (PSL) como sendo um motor nessa disseminação do ódio (bem lembramos
de suas falas sobre negros serem pesados em “arrobas”, sobre estupro em relação
à deputada petista-gaúcha Maria do Rosário, sobre as mulheres receberem menores
salários do que os homens etc.). Na sua percepção, o que temos de consistente
nessas análises sobre o (neo)fascismo e o (neo)nazismo?
Prof. Antonio Marcos: Tanto o nazismo como
o fascismo foram modelos que distorceram o verdadeiro sentido da política,
defendendo os privilégios de uns em detrimento da violência contra outros
considerados inferiores. Para nazi-fascismo aquele que não possui o
mesmo nível social, classe ou cor, por exemplo, deve ser ignorado do ponto de
vista da importância social, deve inclusive ser eliminado. Para eles não seria
possível conviver com o diferente. É o que se percebe no comportamento do
candidato Bolsonaro que não admite ver a empregada (o) doméstica sendo tratado
com dignidade, por sem uma afronta aos privilégios de grupos. Não admite a
mobilidade social e prega todo tipo de ódio ao diferente. Certamente vê no
outro uma ameaça, por isso propõe eliminá-lo.
Blog Poemeiro do Miri: Prof. Antonio Marcos, dito de outra
maneira, o que seriam neonazismo e neofascismo? Senhor avalia que nosso povo
não tá despertado, ainda, para essa questão?
Prof. Antonio Marcos: Tratam-se de
“movimentos” perversos que “ressuscitam” para os tempos atuais a ideia de
violência e preconceito, assim como a necessidade de destruição do outro. O que
importante para eles é pôr fim a dignidade humana de “classes inferiores” e
minorias, tudo em nome de uma falsa paz (que inclusive atrai apoio de setores
conservadores da sociedade), defendem a guerra contra o ser humano que é
diferente ou que pensa diferente. Percebe-se que a falta de atenção para o
perigo desses movimentos, sobretudo em tempos de campanha eleitoral.
Blog Poemeiro do Miri: E sobre os chamados “fake news”,
professor Antonio Marcos, o que o senhor tem a dizer? Esses dias, milhares de
pessoas denunciaram (atribuíram a...) que defensores de Jair Bolsonaro estariam
produzindo milhares de notícias falsas (fakes) para
difamar, desmoralizar o candidato petista Fernando Haddad: o alvo seriam grupos
de “zap-zap”, de igrejas evangélicas, sobretudo neopentecostais, grupos focados
no público feminino-evangélico e outros mais notadamente (ou, em tese)
anti-petistas... Ao sr. parece um fenômeno social bem novo no Brasil, capaz de
gerar uma preocupação (inter)nacional, a ponto de o Presidente do TSE
(instância máxima da Justiça Eleitoral) ter dito, meses atrás, que “fake News
podem anular uma eleição”?
Prof. Antonio Marcos: É uma questão
assustadora, atitudes criminosas, feitas por “profissionais” para fazer parecer
verdade uma informação falsa. Realmente as redes sociais
apresentam-se como ferramentas com dependendo de quem as usa ou para o que se
usa, pode ser favorável ou prejudicial. Percebo que a justiça está um pouco
perdida nesse aspecto, não conseguindo punir ou frear um “recurso” que pode ser
determinante para o processo eleitoral. A quantidade de notícias falsas expondo
supostas imagens ou conteúdos associados ao candidato Fernando Haddad e a sua
vice Manuela D’Avila realmente assusta, resta saber se esses crimes são
praticados de maneira individualizada ou estão alinhadas a um projeto de
marketing eleitoral do candidato opositor. Embora com todos os esforços no
sentido de esclarecer os boatos, não conseguem acompanhar a velocidades de
prejuízos desses crimes ou corrigir os estragos causados. Até justificar para
uns, centenas e milhares já levaram a informação adiante. Estamos vivendo um
período de grande ameaça à democracia, e os fack News parecem ser a
grande arma do principal do antipetismo.
Blog Poemeiro do Miri: Professor, e essa participação das
mulheres, as mobilizações em redes sociais, a produção (surgimento) do
enunciado #EleNão,
os atos de rua, a luta por trabalho, emprego, creches, lazer, respeito à
diversidade...? É uma espécie de “Primavera Árabe”? Esse ineditismo e essa resistência,
enfim: como o sr. analisa essa problemática toda, inscrita e constituidora do
político/eleitoral nestas disputas de 2018 (sabendo-se, podemos
supor, que mantém estreita vinculação com a deposição de uma presidenta da
República, em 2016, internacionalmente interpretado como Golpe de estado...)?
Prof. Antonio Marcos: Percebo nessas
mobilizações populares, grandes iniciativas de resistência que ultrapassam os
limites dessa ou daquela candidatura. Ainda que pareçam atividades de apoio à
este ou aquele candidato, a coisa é muito mais ampla. Há um esforço coletivo de
diversos segmentos da sociedade brasileira, reunindo no caso do # Ele Não,
centenas e milhares de mulheres que há décadas vem lutando por respeito e
dignidade. São clamores que ecoam pelo país inteiro em defesa da democracia e
da preservação de direitos. O que se justifica pela visível ameaça à democracia
(experimentada desde o golpe que retirou a presidenta Dilma Roussef da
presidência em 2015), diante do discurso de ódio e retrocesso do candidato Jair
Bolsonaro, explicito representante da extrema direita no país.
Blog Poemeiro do Miri: Obrigado, professor.